sábado, 16 de fevereiro de 2013

Quando se diz que o raio que atacou a cúpula da Basílica de São Pedro, no Vaticano é uma metáfora da renúncia do Papa Bento XVI ao seu cargo, apesar da definição poder estar correta do ponto de vista técnico, seria talvez mais útil batizar esse fenómeno meteorológico como uma alegoria dos eventos políticos da Igreja (uma alegoria concentrada, uma narrativa reduzida a uma ação única, mas uma alegoria: a instrumentalização de um dado concreto para construir um sentido abstrato).

Apesar da história da poesia estar repleta de uma criatividade metafórica que está muito mais próxima da evidência erótica (a cópula entre dois seres) ou da demiurgia pura (a invenção de quimeras) do que da exemplaridade de um sentido único, a metáfora parece ter adquirido a má fama da falta de imediatez e da grosseria da moralidade.

Ora, a sexualidade metafórica, se tem óbvias consequências de sentido, tende a torná-las mais libertadoras do que opressoras (o que raramente acontece no calculismo alegórico). Por outro lado, não existe verdadeiramente sentido literal (acreditar nisso parece-nos uma prova de infantilidade): duas palavras colocadas uma ao lado da outra relacionam-se em multiplicação e não em adição. Todo o exercício da linguagem tem como destino o dizer-se mais ou menos do que as palavras escolhidas para dizer. A miríade de elipses que acompanham cada enunciado aí está para provar a fraude da literalidade e a latência inexpurgável da alegoria em todos os nossos atos de pensamento.